Poeta: Joseti Gomes
No ranger de uma roldana
sobe um balde de alumínio,
carregado de esperança.
As mãos pequenas sustentam
o choro das águas puras
que deslizam das alturas
dos olhos de uma criança.
………………………………
Ficaram poucos registros
guardados dentro da alma,
das tardes e seus verões…
Na beira de um poço fundo
se puxava, com cuidado,
aquele balde pesado
cheio de água e canções.
Vó Cucha guardava o poço,
como um tesouro sagrado.
Da abertura, no centro,
daquela tampa redonda,
além dela, só os netos,
podiam chegar bem perto
para espiar lá pra dentro.
Lá embaixo, tinha um espelho
que refletia as paredes
revestidas em veludo…
Tinha cheiro de umidade
a carne desses tijolos,
que encantavam os olhos
pequeninos, verde-musgo.
O balde cheio, pesado,
no balançar de uma valsa,
muitas vezes não voltava.
Rodopiando pelo ar,
caia no mesmo instante
naquele olho gigante
do espelho, que se quebrava.
Vó Cucha nos permitia
jogar pedrinhas na água
que as engolia com sede…
Os gritos faziam eco
no vazio do poço fundo,
e parecia que o mundo
morava em suas paredes!
Noutras vezes, parecia
que dentro daquele poço,
com suas idas e voltas,
a secura das gargantas,
encontrava o seu destino.
Gente grande era menino
jogando o balde e a corda.
Porém, a velha guardiã
conservava, em seu ofício,
mistério em baldes vazios…
Por que enchê-los de vida,
nos goles, limpos, dos copos
se a sede grande dos corpos
pedia águas de rios?
Um dia, faz muito tempo,
a água mansa da chuva,
trouxe lágrimas doídas,
trouxe ferrugem pro balde…
Tampa, em cimento, lacrada.
Vó Cucha pegou a estrada
sem tempo pras despedidas…
………………………………
No ranger de uma roldana,
sobe um balde enferrujado
para matar muitas sedes…
Dos mistérios dos espelhos,
brotam versos para o mundo
no verde musgo em veludo
que sobe pelas paredes…