Poeta: Adão Quevedo

Um vulto se aproximando
no lusco fusco do dia…
Era o vô Malaquias
num fim de tarde, chegando…
Vinha ao tranquito, pitando
um palheiro bem sovado
de fumo em rama cortado
com a faca, marca Coqueiro…
cruzando o tempo, faceiro,
num malacara tostado.

Negro velho respeitado
se aprochegando pro rancho,
tinha remendos no poncho
e as mãos grossas de calos.
Gastou arreio e cavalos
campeando rês escondida…
Numa tragada comprida,
foi diminuindo o tranco…
Olhou pro céu e pro campo
e… agradeceu pela vida.

Pensou…

Deus foi bondoso comigo…
Me deu tino de querência,
me fez gaúcho na essência,
me deu o céu por abrigo
e o meu Rio Grande, antigo,
no feitio do coração…
Tempo de apertar a mão,
beijar os pais, os avós,
que ensinaram pra nós
humildade e gratidão.

Fio de bigode valia
bem mais do que documento…
O homem daquele tempo,
tinha fibra, valentia
e a palavra que dizia
era honra, compromisso…
Ao perder-se tudo isso,
hoje, no mundo moderno,
a vergonha anda de terno
e só a ganância dá viço.

Criou seus filhos e netos
sempre na mesma trilha…
Com valores de família
cercados do mesmo afeto…
Todos sob o mesmo teto
numa mesa de fartura…
Da vertente de água pura
até o forno do pão…
Com carinho, devoção
e as mãos cheias de ternura.

Por isso, vô Malaquias,
tu ficaste na campanha…
Lá, o pouco que se ganha
começa ao raiar do dia…
Se ganha na ousadia
de enfrentar o mau tempo
sem nunca perder o senso
do que certo e o que é errado.
Quem honra os antepassados…
traz a querência por dentro.

Um comentário em “Vô Malaquias”

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